Glossário

Amazónia selvagem

A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo, com o maior e mais rico reservatório biológico do planeta. A floresta ocupa quase toda a área da sua bacia, onde são drenados o rio Amazonas e os seus afluentes. Tem aproximadamente, 6,7 milhões de km2, e inclui territórios de 9 países: Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Neste extenso território estão 17% a 20% da água natural global e a cada segundo são descarregadas no Oceano Atlântico 219.000 m3 de água fresca. A Amazónia tem 10% da reserva global de carvão, mais de 350 povoações de indígenas e uma população de 34 milhões de pessoas.

A atividade humana predatória começou em meados do século passado, com a mineração, o abate madeireiro, a criação de gado, a agricultura e a exploração de petróleo e de gás.  A desflorestação, que resulta da exploração madeireira, da expansão da fronteira agrícola e da pecuária tem posto em causa a sua sustentabilidade e o tamanho da floresta que tem vindo a diminuir significativamente. Na década de 90, o governo brasileiro e várias organizações internacionais iniciaram esforços para proteger a floresta, e embora a Amazónia tenha continuado a perder cobertura florestal, o ritmo dessa perda diminuiu consideravelmente como resultado dessas políticas. No entanto, os incêndios em 2019 e as políticas de Jair Bolsonoaro, do presidente do Brasil, vieram arruinar as melhores previsões para a manutenção sustentável deste grande ecossistema. Os 9 países que fazem fronteira com a Amazónia divergem ética, cultural, política, económica e linguisticamente. Estas divergências traduzem-se em variações no tipo de imediatismo e das pressões na sua proporção exercidas sobre a floresta, mas também abrem espaço a oportunidades para a sua conservação.

Neste momento em que nos encontramos, nos anos 20 do século XXI, e numa altura em que o mundo se torna cada vez mais pequeno (resultado da globalização), existe o reconhecimento da comunidade científica, política e da sociedade civil de que a Floresta Amazónica é valiosa para a manutenção de um mundo sustentável e que as razões práticas e éticas para a sua conservação têm vindo a tornar-se cada vez mais óbvias.

O objetivo daqueles que defendem a preservação deste grande ecossistema não é transformar a Amazónia numa reserva natural que ponha em causa o desenvolvimento das populações locais, mas sim a defender a urgência de medidas preventivas e de conservação da floresta que permitam chegar a um verdadeiro “Desenvolvimento Sustentável”.

 

 

O desmatamento

O desmatamento ou desflorestação é o processo de desaparecimento permanente da floresta que resulta em grande parte da intervenção humana. Na Amazónia, esse processo começou em meados do século passado, fruto de políticas dos governos, nomeadamente do Brasil, que através de incentivos fiscais propiciou a expansão de infraestruturas, em especial estradas e energia (construção de barragens), o que tornou o país a maior economia da América Latina, mas também o principal responsável pela desflorestação na região.

O desmatamento é também uma consequência da exploração madeireira, da expansão da fronteira agrícola e da pecuária. Normalmente, o processo acontece assim: os fazendeiros limpam o terreno através do abate de árvores, vendem-nas aos madeireiros e assim financiam a agricultura e a pecuária. O desmata está também associado a grandes fogos florestais e às consequências que estes podem causar ao nível da biodiversidade e das mudanças climáticas locais (e talvez, mesmo globais), nomeadamente através da extinção de numerosas espécies - além de provocar a emissão de gases com efeito de estufa.

Apesar da gestão florestal sustentável parecer bastante promissora do ponto e vista económico, e também ambiental, a verdade é que não tem sido aplicada, ou então é aplicada a escalas muito reduzidas. Vários fatores têm contribuído para esta situação: o desconhecimento generalizado dos benefícios deste tipo de práticas, o lucro que no curto prazo a exploração tradicional permite, o desrespeito da legislação florestal e o tamanho da área da floresta necessária para compensar a procura de uma empresa madeireira. Acresce ainda o facto de os agricultores não estarem dispostos a usar a floresta de forma sustentável no longo prazo, se lhes faltarem condições de crédito e assistência técnica no curto prazo. Por tudo isto, torna-se necessário concentrar esforços para recuperar as áreas desmatadas através da criação de um conjunto de reservas de desenvolvimento, de modo a garantir a proteção das florestas ainda virgens e o habitat das populações indígenas.

O desenvolvimento da Amazónia deve ser feito através da diminuição dos custos sociais e ecológicos da exploração de recursos, bem como a melhoria das condições de vida nas cidades e o controlo das doenças tropicais. “O estado atual do conhecimento e do seu progresso futuro permitem perspetivar um desenvolvimento sustentável da Amazónia que deve privilegiar, não a exploração e domínio da natureza pelo homem, mas a vinculação do homem à natureza.” in Ambiente e Mudanças Globais, GeoINova, Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional, número 9, 2004.

 

Biodiversidade

A biodiversidade é também conhecida como a “Teia da vida” por ser considerada a infraestrutura que sustenta toda a vida na Terra. É composta por todas as coisas vivas: plantas, animais e micro-organismos e pelos ecossistemas dos quais fazem parte. A Amazônia destaca-se por ser a região de maior biodiversidade do planeta, porque abriga grandes reservas de minerais e possui um terço das reservas mundiais de florestas tropicais húmidas. Além disso, forma uma única identidade ecológica funcional - na qual as suas muitas partes dependem da integridade de todas -, e a sua manutenção é essencial para que a sociedade humana moderna exista e continue o seu caminho de progresso.

A floresta tropical não é apropriada para a agricultura convencional devido ao excesso de água das chuvas que empobrecem os solos, mas a sua biologia é muito rica e variada. Um estudo apoiado pela WWF (World Wilde Fund) identificou que entre 1999 e 2015 foram encontradas mais 1,115 plantas, 468 peixes, 321 anfíbios, 112 répteis, 79 pássaros e 65 mamíferos. Em abril de 2016 foi anunciada a descoberta de mais de 1,000 quilómetros de um longo sistema de recife de coral na boca do Rio Amazonas, entre a Guiana Francesa e a fronteira do Brasil. Estima-se que existam entre 6 a 8 mil espécies de peixes, sendo que a maior parte conhecidas até hoje estão nos cursos dos principais rios, perto das grandes cidades ou em algumas áreas protegidas mais intensamente estudadas.

Embora seja reconhecido que a manutenção da biodiversidade é essencial para o desenvolvimento sustentável do planeta, a verdade é que esta vindo a ser ameaçada. A exploração dos recursos naturais de modo desenfreado, a construção de barragens que alteram o curso dos rios, a desflorestação sem regras fora das áreas protegidas e as alterações climáticas em curso podem pôr em perigo este habitat e a população que lá vive e com repercussões ao nível do clima no mundo inteiro. A taxa atual de declínio da natureza sem precedentes na história da humanidade é confirmada pelo novo relatório da Plataforma Intergovernamental de Ciência Política sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos (IPBES), o relatório mais abrangente sobre o assunto.

A situação é premente e só não é mais grave porque há já alguns anos que organizações internacionais e locais começaram a agir no terreno, numa atitude de prevenção e preservação da floresta em todas as áreas. De acordo com alguns especialistas o ponto de não retorno não está muito longe de ser atingido. No entanto, e apesar dos perigos, há bastantes soluções a serem trabalhadas de forma a investir num futuro melhor e sustentável em toda a região da América do Sul e que beneficiem o resto do mundo. 

 

Os rios da Amazónia

A bacia amazônica é a maior bacia hidrográfica do mundo e seu principal rio, o Amazonas é o maior da América do Sul e o maior do mundo em volume de água e com o maior número de afluentes. O Amazonas nasce no alto dos Andes peruanos, a uma altitude de 5.598m e após uma queda inicial na elevação, estabiliza a sua descida em direção ao Oceano Atlântico a uma taxa de 1,5 cm para cada quilômetro ao longo de uma distância de mais de 6.400 km - em alguns lugares o rio atinge uma largura de 10 km.  O curso de água a partir dos Andes cria correntes sazonais em trechos enormes da Amazónia e diferenças regionais criam ecossistemas únicos. O Rio Marañon no Peru é o mais ocidental grande afluente do rio Amazonas e junta-se ao Ucayali (considerado o principal afluente). O fluxo peculiar e a sua geografia criam um ecossistema único, incluindo a estação seca da floresta tropical. As extensas áreas de planície que fazem fronteira com o rio principal e seus afluentes são chamadas “várzeas” e sujeitas a inundações anuais, com consequente enriquecimento do solo. Mais de dois terços da bacia são cobertos por uma imensa floresta tropical, que se transforma em floresta seca e savana nas margens mais altas do norte e sul e em floresta montanhosa nos Andes a oeste. 

Os rios são imprevisíveis e em nenhum lugar isso é mais verdadeiro do que na Bacia do Rio Amazonas, que está sujeita a mudanças sazonais radicais ao longo de todo o ano. Estima-se que cerca de um quinto de toda a água que escorre da superfície da Terra é transportada pela Amazônia.

Todos os anos, a floresta amazônica recebe chuvas torrenciais. Os ventos alísios orientais que sopram do Oceano Atlântico respondem por cerca de metade das chuvas, com a outra metade devido à evapotranspiração - a perda de água do solo por evaporação e pela transpiração das plantas na Bacia do Rio Amazonas. 

 As mudanças climáticas podem aumentar severamente o curso dos rios e os planos para construir 20 hidroelétricas no Marañon vão alterar definitivamente a carga de sedimentos, crítico para a produção primária rio abaixo. Os rios transportam sedimentos e sementes e formam mudanças de bancos de areia utilizados para a migração de peixes e desova, répteis e criação de pássaros e colonização de plantas. Se a evapotranspiração e seu papel na manutenção do equilíbrio ecológico forem interrompidos, o clima em toda a região será significativamente comprometido.

Áreas Protegidas

O termo “área protegida” envolve uma ampla variedade de modelos de conservação, como por exemplo as áreas de gestão focadas apenas na conservação da natureza, gestão ao apoio cultural, espiritual e outros valores dos povos indígenas; a manutenção da extração tradicional das reservas, baixo impacto nos recursos naturais e gestão das áreas protegidas privadas para a conservação das receitas do turismo, entre outros.

As áreas protegidas na Amazónia têm sido o motor da salvaguarda da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas e o apoio ao modo de vida local, desenvolvimento nacional e ambiente global. Hoje, as áreas protegidas cobrem cerca de 2,1 milhões de km2   e mostraram, de uma forma geral, que é eficaz na prevenção e redução da desflorestação, o chamado desmatamento. Os territórios indígenas, geralmente, previnem a desflorestação, com um estudo a mostrar que existe apenas 2 por cento de perda de floresta nos territórios indígenas comparado com 5% nas zonas protegidas. Para garantir o papel dos territórios indígenas, a WWF (World Wild Fund) e o Coordenador da Organização da Amazónia Indígena (COICA) desenvolveram uma estratégia de conservação dos territórios indígenas, com o objetivo de promover e garantir autonomia através da consolidação da integridade do território. Essa estratégia tem vindo a revelar-se fundamental para as vidas das populações indígenas e para as nacionalidades da bacia Amazónica, processo que é feito através de uma gestão holística de herança natural e cultural nos seus territórios.

Antes de 2008 houve um aumento das áreas protegidas, especialmente na zona da Guiana Francesa onde a proteção aumentou de 11,3% para 53,2%, devido à Declaração do Parque da Guiana Amazónica, de 20.300 km2, um dos maiores parques nacionais do mundo, o que aumentou a cobertura de 2,1% para 5,3%.  As áreas protegidas na Amazónia brasileira têm 4 vezes menos desflorestação do que as áreas não protegidas, mesmo as que são de fácil acesso. Atualmente há mais áreas protegidas e os esforços para travar a desflorestação são mais articulados. Segundo os especialistas, o segredo para o sucesso a longo prazo será a gestão da Amazónia como um sistema natural integrado. Existem 713 áreas naturais protegidas e 2.467 territórios indígenas na Amazónia. Cobrem 51% da região, uma extensão maior do que a Índia.

A propósito desse trabalho e da biodiversidade da Amazónia, escreve o Papa Francisco na sua encíclica a Nossa Casa Comum “É louvável a tarefa de organismos internacionais e organizações da sociedade civil que sensibilizam as populações e colaboram de forma crítica, inclusive utilizando mecanismos de pressão para que cada governo cumpra o dever próprio e não-delegável de preservar o meio ambiente e os recursos naturais do seu país sem vender a espúrios interesses locais ou internacionais”.